Ministério se exime de compra de respirador
Matéria que transcrevo do Estadão de hoje por ser
emblemática da incompetência e da inaptidão da atual equipe do Ministério da
Saúde em relaçãoà pandemia da Covid-19
Após descumprir promessas de entrega
de testes de diagnóstico, leitos de UTI, respiradores e equipamentos para
proteção individual, o Ministério da Saúde mudou a orientação sobre compras
contra a covid-19, transferindo a responsabilidade para Estados e municípios em
pleno avanço da pandemia. A guinada de discurso foi registrada em ata de
reunião do Centro de Operações de Emergência (COE) do ministério de 17 de
junho, já sob a gestão interina do general Eduardo Pazuello. O documento obtido
pelo Estadão sugere “deixar claro” que o ministério “não tem a responsabilidade
de fornecer respiradores e EPI (equipamentos para proteção individual)”.
“Isso
ocorreu devido à atual conjuntura da emergência de falta de atendimento no
mercado, porém hoje já estamos com um panorama mais estabilizado possibilitando
aos Estados usarem suas verbas destinadas a esta emergência para aquisição”,
registra a ata. O relato da reunião de 17 de junho não diz de quem partiu a
fala sobre mudar o discurso para compras, mas a reportagem apurou que a
orientação é de auxiliares de Pazuello. A composição dos encontros do COE
varia. Além de técnicos da Saúde, já participaram representantes da Casa Civil,
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Agência Brasileira de
Inteligência (Abin), entre outros. O órgão serve para orientar o ministro da
Saúde sobre ações na pandemia e já alertou sobre benefícios do isolamento,
falta de medicamentos para UTI e sobras de cloroquina, como revelou o Estadão.
Na reunião, representantes da Saúde ainda afirmam que o governo federal
precisava ser “reativo” e atender imediatamente locais mais impactados no
começo da pandemia, mas que a ideia “neste segundo momento” é de “estruturar
onde ainda não aconteceu, levando em consideração capacidade de compra e
logística”.
Auxiliares de Pazuello pediram também
atenção “especial” em contratações extraordinárias, para evitar “tantos
problemas na hora da compra por erros nos editais”. “Verificar com o
solicitante se a demanda está de acordo com a real necessidade e capacidade
para uso de imediato. Fazer um check-list do pedido para entender qual a
urgência da situação no momento, se isto vai realmente salvar vidas naquele
momento”, orienta ainda o COE. Representantes de Estados e municípios
queixam-se de que o Ministério da Saúde, além de descumprir promessas de
compras, não coordenou a aquisição nacional de insumos estratégicos, como
medicamentos usados em UTI para sedar e intubar pacientes graves. Para o
professor da Faculdade de Saúde Pública da USP e primeiro presidente da Anvisa,
o médico Gonzalo Vecina, o ministério deveria liderar as aquisições na crise.
“A política de compra, de garantia de estoque regulador, ou mesmo de tentar
importar produto, é do governo federal. O ministério importa com um ‘pé nas
costas’. Já para um Estado ou município, comprar na pandemia é um desastre”,
disse. O Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) afirma que, no
começo da pandemia, o ministério “chamou para si” a responsabilidade de
distribuição de respiradores. Os Estados “montaram seus leitos de UTI certos de
que receberiam aqueles equipamentos, o que não se concretizou”, diz a entidade
em nota. O Conass afirma que muitos Estados e municípios tiveram de arcar com
compras emergenciais após o governo não cumprir com o prometido. O mesmo
ocorreu com máscaras, luvas e outros equipamentos de proteção, diz. “É
necessário atentar para o fato de que o mercado está desregulado com o consumo
exagerado em escala mundial, exigindo ações coordenadas e efetivas.”
Promessas descumprida - O Ministério da
Saúde chegou a prometer a entrega de 3 mil kits para instalação de leitos de
UTIS. Somente 540 foram enviados. Após licitações fracassadas, a pasta desistiu
de novos contratos. Lançou em 6 de maio e relançou em 24 de junho o programa
Diagnosticar para Cuidar, com praticamente a mesma meta de entrega de testes
para a covid-19: cerca de 46 milhões, sendo 24 milhões do tipo RT-PCR, mais preciso
e que detecta a presença do vírus, e 22 milhões de exames sorológicos
(rápidos), que encontram anticorpos para a doença. Mesmo após reciclar o
programa, no entanto, o governo entregou cerca de 20% dos testes RTPCR e 34%
dos modelos sorológicos prometidos. As promessas descumpridas se repetem com
respiradores. Além de contar com a fabricação nacional, a pasta chegou a fechar
contrato de cerca de R$ 1 bilhão para trazer 15 mil unidades da China, mas, em
29 de abril anunciou que o negócio seria desfeito, pois o acordo não foi
cumprido pela empresa. Não houve pagamento. Depois, o governo passou a contar
com um mutirão da indústria do País para entregar a mesma quantidade. Até a
última semana, mais da metade (7.994) dos respiradores foi distribuída. O presidente
Jair Bolsonaro afirma, desde o começo da pandemia, que o governo federal já fez
a sua parte para conter a doença ao enviar recursos para a saúde a Estados e
municípios. “Vocês não vão botar no meu colo essa conta. O que nós, do governo
federal, fizemos desde o começo: é liberar recursos para saúde. E também criar
aquele benefício emergencial”, disse em 29 de abril. Auditoria do Tribunal de
Contas da União (TCU), no entanto, aponta que, até o fim de junho, o ministério
pagou apenas cerca de 30% do orçamento reservado para a pandemia. Procurado
para comentar sobre diversos pontos em atas do COE, o Ministério da Saúde não
se manifestou sobre a mudança de discurso em relação às compras na pandemia. A
pasta tem destacado que, no lugar da entrega kits para instalação de leitos,
faz o custeio das estruturas, com diária de R$ 1.600 para cerca de 10.500
quartos, montados pelos próprios Estados.
O caso é sério, mas tem solução
https://bit.ly/2CwMpND
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