Em defesa dos
centros históricos
Cida Pedrosa*
A construção da identidade de uma cidade e de suas memórias
afetivas parte do centro. Mas os espaços históricos das cidades brasileiras já
enfrentam, há décadas, um processo de esvaziamento e decadência. No Recife,
esse processo acentuou-se a partir da década de 1970, com comércio e serviços
sendo transferidos para bairros de classe média alta como Boa Viagem,
Espinheiro e Casa Forte, e agravou-se com o surgimento dos shoppings.
Esses centros
de compras juntaram tudo em um só lugar, oferecendo comodidades como
ar-condicionado e amplo estacionamento para uma classe média cada vez mais
motorizada e ávida por segurança. Ruas que antes eram vitrines, como a Nova e a
Imperatriz, deixaram de ser atraentes para esse público. Até mesmo serviços
públicos buscaram novos endereços. Um exemplo é o INSS, que deixou o Edifício
Segadas Viana, na Rua Marquês do Recife. O prédio de dez andares está
abandonado desde 2005 e recentemente foi ocupado por famílias sem teto.
O que já
estava ruim, agravou-se com a pandemia, responsável pelo fechamento de muitas
lojas nos bairros de São José, Santo Antônio e Boa Vista. Só o comércio
ambulante parece manter o vigor numa área que abriga cada vez menos moradores e
acumula muitos imóveis subutilizados, em contraste com o grande déficit de
moradias da cidade.
Mas é
possível construir novas possibilidades de vivência nessa área que concentra
muito do patrimônio histórico da cidade, ainda com grande potencial turístico,
e que já foi um polo de efervescência cultural e de comunicação.
Precisamos
incentivar projetos que promovam a moradia no centro do Recife, principalmente
para as classes menos abastadas, mas também para a classe média que a cada dia
deseja morar mais perto de onde trabalha. No século 17, já havia prédios de uso
misto nessa área, com comércio nos pavimentos térreos e unidades residenciais
nos andares de cima, e esse é um projeto que pode ser retomado. Morar num
centro revitalizado pode significar economia com transporte na maioria dos
deslocamentos, o que barateia o custo de vida, além de resultar numa nova
dinâmica para essas localidades. Isso não é exclusividade do Recife: está na
pauta de muitas capitais brasileiras.
O centro pode
renascer se houver incentivo a novos arranjos culturais e possibilidades
econômicas. Pensando nisso, nosso mandato encabeça a constituição da Frente
Parlamentar pelo Centro do Recife, recentemente aprovada em reunião plenária.
Nosso
intuito, entre outras coisas, é formular, incentivar, implementar, acompanhar e
fiscalizar políticas públicas voltadas para o território central e incentivar a
implementação de ações previstas no Plano Municipal de Preservação das Áreas
Históricas. A cidade “metade roubada ao mar, metade à imaginação”, como definia
o poeta Carlos Pena Filho, precisa ser reinventada e revivida para preservar
seu maior patrimônio: a história de seu povo.
* Advogada, poeta, vereadora do Recife (PCdoB)
.
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