O
menor ENEM da história
José Luís Simões*
A queda no número de
estudantes inscritos no ENEM 2021 é a maior prova do quanto a pandemia afetou
os estudantes, suas perspectivas e sonhos. Professores e estudantes não estavam
preparados para uma rápida mudança nas relações que envolvem o processo
ensino-aprendizagem.
Quem brincou o
carnaval 2020 mal podia esperar que os dias seguintes seriam de incertezas, lockdowns e restrições no trabalho e no
estudo, para tentar conter a pandemia. As escolas fecharam seus portões, as
universidades também. Algumas instituições rapidamente aderiram ao ensino
remoto; outras hesitaram um pouco, mas foram levadas pela grande onda da
Covid-19 a aderir a essa modalidade de aulas. As consequências naturais do
despreparo da comunidade estudantil para essa mudança abrupta na relação
aluno-professor aparecem agora: muitos estudantes estão inseguros, não se
sentem preparados para o ENEM 2021 e por isso não se inscreveram.
Apesar do grande
esforço docente em preparar lives, aprender a usar plataformas de ensino
virtual em tempo recorde e manter o diálogo com estudantes pela internet, o
prejuízo na preparação de jovens para o ENEM é fato. Da mesma forma, a formação
acadêmica dos universitários sofreu com a impossibilidade de aulas e
experiências ou atividades práticas, que requer convívio e contato presencial.
Enfim, a educação foi prejudicada com o alongar das restrições impostas pela
pandemia no Brasil.
O governo Bolsonaro,
lamentavelmente, foi inepto e inconsequente no processo de compra de vacinas, o
que ampliou ainda mais o tempo de pandemia, as restrições de contato físico e,
consequentemente, a manutenção de aulas remotas. Qualquer estudante consequente
preferiria deixar de frequentar o ambiente escolar, assumir prejuízos em sua
formação, do que colocar a vida de familiares em risco. Ora, historicamente, as
escolas sempre foram ambientes de muito contato físico, proximidade, sociabilidade
e interatividade, mas também facilitadoras na proliferação de vírus e
bactérias.
A baixa procura pelo
ENEM 2021 é a ponta do iceberg. O Brasil amarga perto de 550 mil mortes pela
Covid-19. A CPI da pandemia no Senado Federal expõe a excrescência que é parte
da classe política que, ao invés de agilizar a compra de vacinas, se preocupava
em combinar esquema de propinas com empresas com objetivo precípuo da
maracutaia, do ganho fácil no comércio dos imunizantes.
Bestializados, é
assim que ficamos com a incompetência do governo no combate à pandemia, com
elevado número de vidas perdidas e famílias em sofrimento, além do aumento do
desemprego, da fome e da corrupção endêmica. O descompromisso da classe
política é latente, uma vergonha.
A queda no número de inscritos
no ENEM e o prejuízo na formação dos estudantes são alguns dos sintomas de um
Brasil que está doente. O país foi atacado pelo vírus da ignorância, da
incompetência, do desrespeito e da falta de empatia com os de baixa renda. A
Covid-19 ampliou o sofrimento, ela foi o projétil. O governo foi o revólver. O
povo foi o alvo.
Mas a tempestade há
de passar. O povo clama por dias melhores. Os estudantes e profissionais da educação
merecem dias melhores. Mais do que promessas, precisamos de ações e reações que
coloquem o tema da educação como prioridade, afinal de contas, a elevação dos
índices educacionais e ampliação do acesso ao conhecimento são instrumentos de
mudança e de retomada da esperança no futuro.
*Professor do Centro de Educação-UFPE
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