Sinais de virada precoce para um
governo Lula 3
Antes mesmo da posse, um
novo governo terá de fazer alianças e remendar o Orçamento
Vinicius Torres
Freire, Folha de S. Paulo
O
voto útil, o risco de alguma violência, de gracinha dos generais fiscais de
urna e um par de disputas estaduais são os assuntos deste fim de campanha. Uma
debandada precoce para Lula da Silva (PT) começa a surgir na conversa,
embora uma decisão já no 2 de outubro ainda esteja no universo do aleatório.
O
assunto não é motivado exatamente por adesões tais como a de
Henrique Meirelles ao lulismo e de outras figuras simbólicas.
Meirelles foi eleito deputado federal pelo PSDB em 2002, presidente do Banco
Central de Lula de 2003 a 2008, ministro da Fazenda da "Ponte para o
Futuro" de Michel Temer, do MDB "com Supremo, com tudo", de 2016
a 2018, e secretário da Fazenda do tucanato em estado terminal de João Doria,
2019 a 2022.
Meirelles
ora está no União Brasil, união instável entre o DEM, o velho PFL, e parte do
partido que Jair Bolsonaro alugou
em 2018, o PSL. O outro bando de bolsonaristas originais, por assim dizer, foi
parar no PL. A enumeração quase caótica dessas siglas não é por acaso.
O assunto da debandada aparece porque, na surdina ou abertamente, há
novas adesões a Lula. Há gente do próprio PL, há gente do PSDB que não vê
futuro nas ruínas do partido e outros adesistas no União Brasil. Parte do MDB
que não aderiu a Lula na primeira leva já "manda sinais". O racha vai
ser meio feio, mas parte do PSD de Gilberto Kassab vai aderir a um Lula 3.
E daí? Mesmo neste país mais partido do que nunca, as debandadas
adesistas não são de estranhar. Depois de 2002, na eleição de Lula 1, uma fatia
gorda do então grande PFL pulou para o barquinho de partidos menores a fim de
atracar em algum carguinho no governo petista.
Embora tudo isso seja ainda especulativo e incerto (como o é uma vitória
lulista no dia 2), o assunto é relevante porque a primeira tarefa de um novo
governo, lulista ou bolsonarista, é remendar o Orçamento de 2023. Sempre uma
ficção, a tabela de gastos é agora uma fantasia elevada ao quadrado por causa
de promessas "firmes" de gasto extra apresentadas nesta campanha.
Lula
e Bolsonaro prometeram um Auxílio Brasil de
R$ 600, para o que não há dinheiro previsto. Lula sugeriu que pode corrigir o
salário mínimo e o dos servidores já em 2023 (também não há dinheiro previsto).
Falta,
por exemplo, previsão de dinheiro para o
Farmácia Popular. Sabe-se lá o que será feito do subsídio para
combustíveis, talvez de precatórios e compensações para estados e municípios
(que reclamam da perda de receita com a redução das alíquotas do ICMS), casos
que estão ou ficarão enrolados na Justiça.
Esse
nem é o debate duro, difícil e fundamental acerca da reforma das regras fiscais
(que tipo de "teto" ou limite vai haver, se algum). É apenas o
remendo das contas finais e avacalhadas do governo Bolsonaro. No entanto, um
ligeiro estelionato eleitoral, a quebra dessas promessas de campanha, seria um
mau começo de governo —não tanto quanto o desastre que praticamente selou o
destino de Dilma Rousseff em 2015. Mas não vai ser bom.
Além disso, uma eventual debandada para um hipotético Lula 3 e a
composição partidária para remendar o Orçamento serão um primeiro teste de
viabilidade política da coalizão que governará a partir de 2023.
Há dúvidas várias. O núcleo do centrão, ora regido pelo PP em
colaboração com o PL, queimou navios e pontes com Lula, embora sempre possam
boiar até a outra margem, como ocorre com tantos dejetos. Há uma
extrema-direita feroz, antilulista e há até esse novo PDT de Ciro Gomes. Etc.
Se a eleição acabar logo, o novo governo terá de começar ainda mais
cedo.
Leia também: Bolsonaro e o baile da Ilha Fiscal https://bit.ly/3eqD64I
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