Por José Carlos Ruy*
Neste ano ocorrerão dois grandes eventos no
Brasil. O primeiro será esportivo: a Copa do Mundo de futebol, entre 12 de
junho e 13 de julho. O outro será a eleição presidencial (além de deputados
federais e estaduais, senadores e governadores), que ocorrerá em 5 de outubro.
Embora sejam eventos de natureza diferentes (um esportivo, outro político), eles estão intimamente ligados, articulação que aparece sobretudo no noticiário conservador dos jornais onde, desde o início do ano, acumulam-se as críticas contra a Copa, que se repetem desde seu anúncio, em 2007. E, no ano da Copa, se avolumam.
Logo nos primeiros dias do ano a Fifa voltou ao ataque pela voz de seus principais dirigentes. O presidente Joseph Blatter disse que as obras e os preparativos de infraestrutura estão atrasados (embora tenha reconsiderado isso em sua página no Twitter, onde reconheceu que os preparativos estão "a todo vapor" e que esta é a "Copa das Copas"). O secretário-geral da Fifa, Jérôme Valcke, por sua vez, criou novo mal-estar com as autoridades brasileiras dizendo que o distanciamento entre elas e a Fifa é cada vez maior e que em relação às obras, não poderá haver um período de testes.
Há a suspeita, veiculada por analistas do jornal Valor Econômico, de que, no ano da Copa, a Fifa queira se desvincular de eventuais problemas que apareçam (por exemplo, protestos de rua promovidos por black-blocs), jogando sobre o governo a culpa por eles.
É uma hipótese. A mais provável, entretanto, é que a Fifa faça sua parte no conluio conservador. Cujo maior representante no Brasil é a aliança tucano-neoliberal. Conluio que não engole as mudanças que, embora ainda iniciais, a série de governos democrático-populares iniciada com a posse de Luiz Inácio Lula da Silva em 2003, está promovendo.
Soccernomics - Outro ataque que tem parecido na arena internacional foi o livro Soccernomics (Economia do futebol, ao pé da letra), dos ingleses Simon Kuper (jornalista) e Stefan Szymanski (economista), que contestam qualquer correlação entre economia e futebol e negam que possa haver crescimento ou desenvolvimento em consequência da Copa. "A ideia de que a Copa vai impulsionar a economia é um mito", disse o jornalista. E no mesmo tom dos conservadores brasileiros, rejeita qualquer legado econômico da Copa. “Se você quer impulsionar a economia com o dinheiro do povo, que paga impostos, é melhor investir em escolas e hospitais", disse.
Os autores revelam um aberto desconhecimento da relação entre investimentos em saúde e educação e sua correlação com os gastos do governo com a Copa do Mundo. Desde 2007 o investimento federal em saúde e educação foi de 758,6 bilhões de reais; na construção de estádios, para a Copa de 2014, foi de 7 bilhões (menos de 1% daquele total) nesse período; deste total, 3,7 bilhões são empréstimos do BNDES, a serem pagos de acordo com as regras do banco.
A comparação seria mais aceitável se os autores do livro cotejassem os gastos em saúde e educação com os juros pagos pelo governo à especulação financeira – apenas em 2010, eles abocanharam 45% do total do orçamento da União, representando a soma gigantesca de 2,2 trilhões de reais, num padrão de exploração que se repete nos orçamentos da União e revelam a forte presença e poder da especulação financeira que arrebata, ano após ano, cerca de três vezes o valor dos recursos orçamentários destinados à saúde e à educação públicas.
Orgulho nacional - O pessimismo da Fifa, de setores da mídia golpista e dos setores conservadores brasileiros (e, como se vê, estrangeiros) não corresponde à visão das autoridades brasileiras. O ministro do Esporte, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), apoia-se em pesquisa feita pela Ernst&Young para falar na grande oportunidade que a Copa representa para o Brasil em termos de crescimento econômico. O país, disse, vai “acelerar investimentos em infraestrutura e qualificação de mão-de-obra”. Além disso, a Copa movimentará 142,4 bilhões de reais adicionais entre 2010 e 2014, criará 3,63 milhões de empregos, e atrairá cerca de 600 mil turistas estrangeiros.
O governo brasileiro não está sozinho nessa avaliação. Pesquisa recente feita pelo Instituto Análise (referida em matéria publicada no jornal Valor Econômico pelo sociólogo Alberto Carlos Almeida, diretor daquele Instituto) a Copa aumenta o orgulho de ser brasileiro de 70% dos entrevistados, e diminui apenas o de 14% pessimistas (e conservadores...). A Fifa e a mídia conservadora brasileira talvez não percebam essa realidade com a qual batem de frente.
Aliás, quase metade dos entrevistados (48%) acham que o Brasil deve dar uma banana para a Fifa e fazer uma Copa do Mundo com características nacionais. Esta não é uma boa notícia para Blatter e Cia! Somente 26% acham que o Brasil deve se submeter às exigências da Fifa já que o país assinou um contrato com a entidade.
Além do mais, diz aquele analista, a Fifa deveria antes reconhecer o amplo sucesso das vendas de ingressos para a Copa do Mundo no Brasil, o maior desde quando Blatter está na presidência da entidade. “Seria melhor se reconhecesse que essa enorme demanda por ingressos é um indicador antecedente de que a demanda será grande por tudo que se refere à Copa”, diz Alberto Carlos Almeida.
Mais ainda: em relação ao ponto específico das críticas, a construção dos estádios: 63% dos entrevistados pensa que eles serão motivo de orgulho para os brasileiros, por sua beleza e qualidade, e número idêntico (64%) pensam que eles trarão investimentos e desenvolvimento econômico para suas regiões e cidades. Os mesmos 64% concordam que os estádios facilitarão a realização de eventos de entretenimento ou cultos religiosos; outros (66%) acham que vão atrair jogos de times de outros Estados; outros (58%) acham ainda que vão “ajudar a mudar o público que vai aos jogos de futebol, atraindo mais famílias, mulheres e crianças”.
Copa e crescimento econômico - São análises desse tipo, na contramão da corrente principal do noticiário da mídia conservadora, que permitem ao ministro Aldo Rebelo escrever que “A Copa, e a capilarização de efeitos sociais e econômicos que injeta na sociedade brasileira, consolida-se como uma usina geradora de equipamentos públicos, bens e serviços para usufruto da população”. Como fez no último artigo que publicou, em 2013, no jornal Diário de S. Paulo (sob o título O ano da semente, no dia 28 de dezembro). A tarefa adicional para 2014, disse ele, “será a superação das incompreensões e a fixação no público da verdade meridiana de que a Copa e as Olimpíadas são boas para o Brasil. São investimentos antes de gastos a fundo perdido. Geram negócios, empregos, impostos, renda, além de nos trazerem as duas grandes festas do esporte. Projetam o País e seu povo dinâmico. Se temos a certeza factual de que a 20ª Copa do Mundo será um sucesso, resta a se completar a esperança verde-amarela do hexacampeonato”.
Isto é, aqueles que torcem contra a Copa e contra o Brasil, na esperança de criar dificuldades eleitorais para a reeleição de Dilma Rousseff, estão em dificuldades. A Copa, em junho/julho, será um sucesso devido ao sentimento dos brasileiros. E em outubro o atual projeto político que controla a presidência vencerá novamente a eleição numa realidade desesperadora para a oposição conservadora brasileira. A Copa e as eleições estão mesmo ligadas, e não se pode dizer que tenha sido os progressistas e a esquerda que promoveram essa ligação: são os próprios conservadores que, no segundo semestre do ano, irão provar de seu próprio veneno.
*José Carlos Ruy é editor do Jornal A Classe Operária e membro do Comitê Central do PCdoB.
Embora sejam eventos de natureza diferentes (um esportivo, outro político), eles estão intimamente ligados, articulação que aparece sobretudo no noticiário conservador dos jornais onde, desde o início do ano, acumulam-se as críticas contra a Copa, que se repetem desde seu anúncio, em 2007. E, no ano da Copa, se avolumam.
Logo nos primeiros dias do ano a Fifa voltou ao ataque pela voz de seus principais dirigentes. O presidente Joseph Blatter disse que as obras e os preparativos de infraestrutura estão atrasados (embora tenha reconsiderado isso em sua página no Twitter, onde reconheceu que os preparativos estão "a todo vapor" e que esta é a "Copa das Copas"). O secretário-geral da Fifa, Jérôme Valcke, por sua vez, criou novo mal-estar com as autoridades brasileiras dizendo que o distanciamento entre elas e a Fifa é cada vez maior e que em relação às obras, não poderá haver um período de testes.
Há a suspeita, veiculada por analistas do jornal Valor Econômico, de que, no ano da Copa, a Fifa queira se desvincular de eventuais problemas que apareçam (por exemplo, protestos de rua promovidos por black-blocs), jogando sobre o governo a culpa por eles.
É uma hipótese. A mais provável, entretanto, é que a Fifa faça sua parte no conluio conservador. Cujo maior representante no Brasil é a aliança tucano-neoliberal. Conluio que não engole as mudanças que, embora ainda iniciais, a série de governos democrático-populares iniciada com a posse de Luiz Inácio Lula da Silva em 2003, está promovendo.
Soccernomics - Outro ataque que tem parecido na arena internacional foi o livro Soccernomics (Economia do futebol, ao pé da letra), dos ingleses Simon Kuper (jornalista) e Stefan Szymanski (economista), que contestam qualquer correlação entre economia e futebol e negam que possa haver crescimento ou desenvolvimento em consequência da Copa. "A ideia de que a Copa vai impulsionar a economia é um mito", disse o jornalista. E no mesmo tom dos conservadores brasileiros, rejeita qualquer legado econômico da Copa. “Se você quer impulsionar a economia com o dinheiro do povo, que paga impostos, é melhor investir em escolas e hospitais", disse.
Os autores revelam um aberto desconhecimento da relação entre investimentos em saúde e educação e sua correlação com os gastos do governo com a Copa do Mundo. Desde 2007 o investimento federal em saúde e educação foi de 758,6 bilhões de reais; na construção de estádios, para a Copa de 2014, foi de 7 bilhões (menos de 1% daquele total) nesse período; deste total, 3,7 bilhões são empréstimos do BNDES, a serem pagos de acordo com as regras do banco.
A comparação seria mais aceitável se os autores do livro cotejassem os gastos em saúde e educação com os juros pagos pelo governo à especulação financeira – apenas em 2010, eles abocanharam 45% do total do orçamento da União, representando a soma gigantesca de 2,2 trilhões de reais, num padrão de exploração que se repete nos orçamentos da União e revelam a forte presença e poder da especulação financeira que arrebata, ano após ano, cerca de três vezes o valor dos recursos orçamentários destinados à saúde e à educação públicas.
Orgulho nacional - O pessimismo da Fifa, de setores da mídia golpista e dos setores conservadores brasileiros (e, como se vê, estrangeiros) não corresponde à visão das autoridades brasileiras. O ministro do Esporte, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), apoia-se em pesquisa feita pela Ernst&Young para falar na grande oportunidade que a Copa representa para o Brasil em termos de crescimento econômico. O país, disse, vai “acelerar investimentos em infraestrutura e qualificação de mão-de-obra”. Além disso, a Copa movimentará 142,4 bilhões de reais adicionais entre 2010 e 2014, criará 3,63 milhões de empregos, e atrairá cerca de 600 mil turistas estrangeiros.
O governo brasileiro não está sozinho nessa avaliação. Pesquisa recente feita pelo Instituto Análise (referida em matéria publicada no jornal Valor Econômico pelo sociólogo Alberto Carlos Almeida, diretor daquele Instituto) a Copa aumenta o orgulho de ser brasileiro de 70% dos entrevistados, e diminui apenas o de 14% pessimistas (e conservadores...). A Fifa e a mídia conservadora brasileira talvez não percebam essa realidade com a qual batem de frente.
Aliás, quase metade dos entrevistados (48%) acham que o Brasil deve dar uma banana para a Fifa e fazer uma Copa do Mundo com características nacionais. Esta não é uma boa notícia para Blatter e Cia! Somente 26% acham que o Brasil deve se submeter às exigências da Fifa já que o país assinou um contrato com a entidade.
Além do mais, diz aquele analista, a Fifa deveria antes reconhecer o amplo sucesso das vendas de ingressos para a Copa do Mundo no Brasil, o maior desde quando Blatter está na presidência da entidade. “Seria melhor se reconhecesse que essa enorme demanda por ingressos é um indicador antecedente de que a demanda será grande por tudo que se refere à Copa”, diz Alberto Carlos Almeida.
Mais ainda: em relação ao ponto específico das críticas, a construção dos estádios: 63% dos entrevistados pensa que eles serão motivo de orgulho para os brasileiros, por sua beleza e qualidade, e número idêntico (64%) pensam que eles trarão investimentos e desenvolvimento econômico para suas regiões e cidades. Os mesmos 64% concordam que os estádios facilitarão a realização de eventos de entretenimento ou cultos religiosos; outros (66%) acham que vão atrair jogos de times de outros Estados; outros (58%) acham ainda que vão “ajudar a mudar o público que vai aos jogos de futebol, atraindo mais famílias, mulheres e crianças”.
Copa e crescimento econômico - São análises desse tipo, na contramão da corrente principal do noticiário da mídia conservadora, que permitem ao ministro Aldo Rebelo escrever que “A Copa, e a capilarização de efeitos sociais e econômicos que injeta na sociedade brasileira, consolida-se como uma usina geradora de equipamentos públicos, bens e serviços para usufruto da população”. Como fez no último artigo que publicou, em 2013, no jornal Diário de S. Paulo (sob o título O ano da semente, no dia 28 de dezembro). A tarefa adicional para 2014, disse ele, “será a superação das incompreensões e a fixação no público da verdade meridiana de que a Copa e as Olimpíadas são boas para o Brasil. São investimentos antes de gastos a fundo perdido. Geram negócios, empregos, impostos, renda, além de nos trazerem as duas grandes festas do esporte. Projetam o País e seu povo dinâmico. Se temos a certeza factual de que a 20ª Copa do Mundo será um sucesso, resta a se completar a esperança verde-amarela do hexacampeonato”.
Isto é, aqueles que torcem contra a Copa e contra o Brasil, na esperança de criar dificuldades eleitorais para a reeleição de Dilma Rousseff, estão em dificuldades. A Copa, em junho/julho, será um sucesso devido ao sentimento dos brasileiros. E em outubro o atual projeto político que controla a presidência vencerá novamente a eleição numa realidade desesperadora para a oposição conservadora brasileira. A Copa e as eleições estão mesmo ligadas, e não se pode dizer que tenha sido os progressistas e a esquerda que promoveram essa ligação: são os próprios conservadores que, no segundo semestre do ano, irão provar de seu próprio veneno.
*José Carlos Ruy é editor do Jornal A Classe Operária e membro do Comitê Central do PCdoB.
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