Fernando Nogueira da Costa, Brasil Debate
Mansueto Facundo de Almeida Jr já assumiu os seguintes cargos públicos:
coordenador-geral de Política Monetária e Financeira na Secretaria de Política
Econômica no Ministério da Fazenda (1995-1997), na equipe de Pedro Malan,
assessor da Comissão de Desenvolvimento Regional e de Turismo do Senado Federal
(2005-2006) e Assessor Econômico do Senador Tasso Jereissati (PSDB-CE). É
funcionário de carreira do IPEA em Brasília, mas, a partir de junho de 2014,
passou a gozar de licença sem vencimento do órgão público para escrever seus
panfletos oposicionistas mais à vontade como assessor do candidato Aécio,
herdeiro da dinastia dos Neves de São João d’El Rey – MG.
No panfleto postado em seu blog no dia 6 de outubro de 2014 – “O papel
dos bancos públicos na visão do governo” –, inicia destratando a Presidenta da
República ao caluniá-la como mentirosa por ela ter dito que, “se a oposição
ganhar a eleição, os subsídios terminariam, o que ocasionaria juros mais
elevados e redução do investimento em infraestrutura”. Paradoxalmente, ele
escreve seu panfleto confirmando exatamente essa impressão da Presidenta!
O objeto do maior queixume choramingueiro é a atuação proativa do BNDES.
De fato, em pleno período anterior ao “apagão de 2001”, o BNDES emprestou de
1997 a 1999 apenas R$ 19 bilhões, anualmente, e só passou para o patamar de R$
26 bilhões em 2000 e 2001.
Depois, o BNDES passou a ter um papel ativo no governo
social-desenvolvimentista e o valor anual, nos últimos dois anos, está em torno
de R$ 190 bilhões. Por exemplo, financiou a construção da Usina Hidrelétrica de
Belo Monte, a quarta maior do mundo, cujo empréstimo de R$ 22,5 bilhões para o
projeto foi o maior da história do banco, correspondendo a 78% do total (R$
28,9 bilhões) a ser investido na hidrelétrica.
A crítica oposicionista à atuação recente do BNDES é que ela seria
baseada em concessão de “subsídio” e “favorecimento” ao organizar grandes
empreendimentos em associação com grandes empresas brasileiras. Com essa
“escolha dos parceiros estratégicos”, ele ofereceria subsídios e incentivaria a
formação de conglomerados que, sob o argumento de melhoria da competitividade
da indústria brasileira, atentariam contra o livre-mercado.
Não cabe essa crítica de “favorecimento”, pois qualquer escolha de
setores prioritários na estratégia de crescimento explicitada no PAC (Programa
de Aceleração Econômica), evidentemente, exigia selecionar as empresas
contempladas com financiamento. Isto foi realizado, transparentemente,
inclusive as empresas foram nomeadas no site do Banco.
Defender isonomia entre empréstimos dirigidos aos grandes grupos,
responsáveis pelos principais projetos em andamento, principalmente ligados à
Petrobras, e às micros, pequenas e médias empresas era desculpa antes adotada
para não se escolher o caminho do desenvolvimento. Era, então, coerente com a
atitude passiva pro mercado. Em nome de “não privilegiar clientes”, emprestava
apenas para se privatizar o patrimônio público!
O oposicionista a favor do livre-mercado estima o custo anual do
subsídio, comparando o custo atual do financiamento da dívida pública (SELIC)
com a TJLP. Aplica essa diferença ao montante da capitalização do Banco por seu
controlador, o Tesouro Nacional, via empréstimo em longo prazo. Faz cálculos
estáticos para resultados dinâmicos. Não contempla o investimento multiplicador
de renda, a elevação da arrecadação fiscal e nem o pagamento futuro de
dividendos. O valor exato dos juros sobre a capitalização do banco só poderá
ser conhecido no fim do financiamento. Poderá ser bem menor do que a quantia
então estimada, ocorrendo uma futura convergência da TJLP e da Selic.
Sem visão estratégica sobre a obtenção de crescimento sustentado em
longo prazo, a oposição só destaca o impacto fiscal dos empréstimos da União ao
BNDES. Dado que os empréstimos têm custo indexado majoritariamente pela TJLP,
haveria, em princípio, “subsídio” igual à diferença entre o custo de mercado do
financiamento da União, baseado em Selic, e a TJLP. Esse cálculo, visto
isoladamente, pode suscitar conclusões equivocadas, pois ignora os ganhos
fiscais resultantes das operações viabilizadas pelo empréstimo da União, entre
eles:
1. o lucro do BNDES, que retorna à União por meio de dividendos,
tributos e lucros retidos;
2. o ganho fiscal em curto prazo, decorrente da expansão do produto e da
renda da economia; e
3. o ganho fiscal em longo prazo, resultante do fato de que a capacidade
produtiva da economia será maior nos próximos anos, viabilizando o crescimento
da demanda sem pressão inflacionária, maior Produto Interno Bruto (PIB) e
arrecadação fiscal mais elevada.
O governo social-desenvolvimentista justifica a existência do BNDES para
corrigir a lógica do mercado, realocando recursos para setores prioritários,
mas não tão lucrativos e atraentes para iniciativas particulares.
Em termos de custo fiscal e Orçamento Geral da União, o BNDES pode
“fazer mais por menos”, isto é, gerar políticas públicas cujo gasto efetivo sai
por cerca de 10% do custo fiscal potencial. São nove vezes mais, desde que o
Índice de Basileia exige 11% do capital para cobertura dos empréstimos.
As alocações orçamentárias da União para ele se transformam em reservas
para alavancar empréstimos. Os empréstimos do banco público possuem impacto
suficiente para multiplicar a quantidade de dinheiro na economia, exacerbando
ciclos de expansão ou atuando contra ciclo de queda.
Os neoliberais, quando estiveram no poder, colocaram nos bancos públicos
a função de carregar títulos de dívida pública, dando ao governo certa
autonomia em relação aos bancos privados. A missão principal deles passou a ser
obter lucros para pagar dividendos ao Tesouro Nacional, elevando o superávit
primário. O BNDES, antes, apenas financiava a privatização do patrimônio
público, executando o Programa Nacional de Desestatização.
Os neoliberais chegaram até mesmo a questionar, embora não obtivessem
apoio político para mudar, o que consideram um dogma ideológico: o banco
público usar, exclusivamente, os fundos sociais, evitando obtenção de lucros
pelos bancos privados com dinheiro público.
*
Fernando Nogueira da Costa é professor livre-docente do IE-Unicamp. Autor de
“Brasil dos Bancos” (Edusp, 2012), ex-vice-presidente da Caixa Econômica
Federal (2003-2007)
Leia mais sobre temas da atualidade: http://migre.me/kMGFD
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