Desmandos da Lava Jato
atestam que modelo atual é falho e manipulado
Novas transcrições de mensagens dão um salto temático no poço das
intromissões americanas na soberania brasileira
Janio de
Freitas, na Folha de S. Paulo
As novas, mas não últimas, transcrições de
mensagens da Lava Jato curitibana dão um salto temático no
poço, tenebroso e sem fundo, das intromissões americanas na soberania
brasileira.
Não
foi por obra do acaso que esse capítulo a mais da amizade inconfiável se
configurou no âmbito da Lava Jato,
empreendimento político em área judicial e com bolsonaras consequências também
nas relações externas.
As mensagens transcritas e seus aditivos dedicam-se à ação e aos
agentes do FBI na América Latina, a título de investigar empresas americanas na
corrupção local.
Se
provada, a participação sujeita a punições, sobretudo financeiras, nos Estados
Unidos. Um tratado Brasil-EUA autoriza tais investigações aqui e estende o
acordo à colaboração mútua em investigações, com normas intermediadas pelo
Ministério da Justiça. No mesmo gênero, há acordos sobre tráfico de drogas.
As
mensagens transcritas expõem a falta de adequação, controle e limite na
interação de Lava Jato e pessoal do FBI no Brasil. No muito extenso e um tanto
caótico material publicado, sobressaem Deltan Dallagnol e
sua tentativa de burlar as regras do acordo para obter, por desvio clandestino,
a localização e prisão nos EUA de um alvo da Lava Jato, seguidas de extração
para o Brasil.
Dallagnol,
de maneira bem característica, prefere não obter o pretendido a se sujeitar às
leis e a um acordo internacional do Brasil.
Coordenadora
dos agentes secretos da alegada caça à corrupção, na América do Sul, Leslie Rodrigues
Backschies não aparece bastante no material transcrito. Mas não
pelo melhor.
Trata-se
de sua explicação para o empenho do FBI na caça a corruptos aqui e alhures: é a
segurança dos Estados Unidos e de seus cidadãos. A corrupção pode financiar o
terrorismo. Mas não só. Nas sociedades onde as pessoas se sentem governadas por
corruptos, “irão buscar outros elementos [...] que veem como limpos. E isso se
torna uma ameaça para a segurança”. A deles lá.
Curioso: combatem a corrupção da velha política, mas o novo é
“uma ameaça”. A explicação da agente principal nem precisou explicitar a
solução: combater a corrupção, que pode financiar o terrorismo, e impedir o
novo, porque “se torna uma ameaça” de recusar a subserviência da velha
política.
É
assim e por isso que o FBI, a CIA, a NSA (a dos grampos em Dilma)
se transfiguram em poderes eleitorais. Como sabem, muito bem, Sergio Moro, tão
homenageado pelos agradecidos dos Estados Unidos, e Deltan Dallagnol, que,
agradecido ele, reconhece nas mensagens o seu aprendizado com os agentes
americanos.
Crítico
da Lava Jato sem expor os motivos, ainda assim o procurador-geral da República,
Augusto Aras, tem razão. As ilegalidades, os desmandos e desvios de finalidade
da Lava Jato atestam que o modelo atual de força-tarefa é falho e manipulado
com má-fé, pernicioso.
Mas
seu projeto de uma central das forças-tarefas levaria as deficiências de hoje
ao extremo. É um projeto de poder pessoal, não a solução. Que precisa ser
buscada, assim como é necessária uma força-tarefa para investigar a
força-tarefa da Lava Jato, em nome do país.
Desafios da realidade concreta https://bit.ly/3fd2YMs
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