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Golpe de Bolsonaro antes da
eleição previne incerteza de impô-lo depois
Janio de Freitas, Folha de S.
Paulo
A
situação dos adeptos de regime democrático volta à extravagância aguda. Não se
tem segurança de que as forças mantidas a alto custo para assegurá-la o farão.
Muito ao contrário. Fazem parte do que ameaça.
O
considerado exorbitante pelas Forças Armadas, na expectativa do regime
democrático a seu respeito, é que não extrapolem de sua finalidade. Respeitem a
Constituição e cumpram a lei. Só. Em duas palavras definitivas: sejam
profissionais.
Há
132 anos e meio, ou desde trazida a República na ponta da espada e não da pena
legislativa, expectativa e frustração confundem-se. A expressão "fora da
lei" é levada a alcance além de sua utilidade policial.
Foi
literalmente à vista. Bolsonaro interrompe a leitura do ato de graça (é o termo
técnico para a diferença de indulto) e enfatiza: "...que vai ser
cumprido". Logo, estava advertido da provável invalidade do seu ato, por
avaliação do Supremo Tribunal Federal. E informa considerar
sua vontade acima da Constituição, das leis e do Supremo. Comunica o fim da
ordenação legal do nosso rascunho de democracia: a ditadura, pois.
Um
passo simplório, em mangas de camisa, ao lado da mulher dispersiva, debruçado
na mesa. Apesar de falsa, é semana de Carnaval, o que facilita o entendimento
do ato.
A
partir do final de 2014, com a mentira de fraude eleitoral propagada pelo
derrotado Aécio Neves (ainda não flagrado em alta corrupção), não há crise
institucional e política: a instabilidade e a degeneração do regime são
crônicas. Estão em seu oitavo ano sem encontrar resistência. O regime nem
precisa mais de fato relevante para seus saltos degradantes. Invertida a
segurança da integridade constitucional, o mínimo é suficiente.
A
atual agressão golpista pode ser item de um roteiro, mas vem de uma
insignificância política. O ex-PM Daniel Silveira não tem importância
alguma para Bolsonaro. É só um gorila a mais. Com uma condenação à sua espera,
provocou no Supremo um julgamento, esse sim, de interesse para o golpismo.
Seria coisa banal, um incitador de insubordinações criminosas levado a
julgamento. Agendada a respectiva sessão judicial, porém, Bolsonaro retomou os
ataques ao Supremo e ao Superior Eleitoral. Preparação, na certa.
Advertidos
da provável recusa jurídica ao ato de graça, é claro que Bolsonaro e os autores
da ideia programaram o segundo tempo: sua resposta à resposta pública e
judicial ao decreto abusivo. Não sendo esse passo vindouro a aceitação do que o
Judiciário ou o Congresso formalize sobre o ato, seria difícil Bolsonaro
sustentar, só com o movimento bolsonarista, o avanço que cometeu, rumo à
ditadura. Mesmo que as PMs o sigam.
Nessa
circunstância, a nenhum lado cabe dúvida do dever constitucional das Forças
Armadas. A dúvida é se mais uma vez não o cumpririam. Repete-se um suspense já
muito vivido. Por uma vez vencido pela legalidade, que se impôs com um levante
heroico, dos gaúchos, ao golpismo ressurgido da renúncia de Jânio Quadros. O golpismo de Bolsonaro avança, no entanto, em
momento de complexidade nova.
Os
militares, em particular os do Exército, estão indignados e perplexos com a
massa de críticas que expõem um conceito público demolidor da sua autoimagem de
vestais onipotentes e admiradas. Ao longo de muitas décadas, têm negado a
história com ficções que enaltecem suas ações abusivas de poder, inclusive
quando criminais, e inexiste negação honesta das críticas.
A
esse estado insalubre sobrevém a revelação do reconhecimento por generais, no
Superior Tribunal Militar durante a ditadura, de torturas e massacres por
militares, em dependências das Forças Armadas. Para não se mostrar, a ira de
generais de hoje recorre ao deboche primário. Mas, com certeza, não se atenua,
nem civiliza.
Muitos
desses militares, a maioria dos que sinalizaram posição política, são mais
identificados com Bolsonaro que com a Constituição e o regime democrático.
Também é reconhecível uma observação já exposta aqui: para Bolsonaro, o golpe
antes da eleição previne a situação incerta de impô-lo para obter o negado
pelas urnas. O que, aplicado ao avanço de Bolsonaro contra a Constituição e o
que restava de prática de democracia, leva a este resumo da situação: ???
.
Veja: Federação para eleger Lula https://bit.ly/3uGYIiS
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