Carga negativa
Paulo
Nogueira Batista Jr., no portal da Fundação Maurício Grabois
Disputa política está
contaminando tudo. Cinema, festival de música, ciclistas, velórios, camisetas,
políticos em espaços públicos. Tudo é motivo para a expressão odiosa de
platitudes contra o Governo.
Estou
horrorizado com o Brasil, leitor. Não me refiro propriamente à situação
política e econômica, que é, sem dúvida, muito difícil. O que me estarrece é a
imensa carga de negatividade na imprensa, nos meios de comunicação e nas
conversas. Não me recordo de ter vivenciado clima tão nocivo e uma energia tão
destrutiva. O país parece estar sofrendo um colapso emocional só comparável ao
que aconteceu com a seleção brasileira no jogo contra a Alemanha na Copa.
Posso estar
exagerando. Mas vou dar um exemplo que pode parecer pequeno, mas não é. Está em
cartaz nos cinemas um grande filme brasileiro: “Que horas ela volta?”, de Anna
Muylaert. É um filme feito com cuidado, delicadeza, sensibilidade. A construção
de cada personagem foi elaborada com maestria, de forma tocante, convincente. O
filme emociona, sem ser apelativo. Enfim, é uma obra de arte.
Pois bem, um
grande jornal de São Paulo resolveu publicar uma página inteira sobre “Que
horas ela volta?”. Não quero ser agressivo com ninguém, nem contribuir para o
ambiente medonho que vivemos. Só direi o seguinte: antigamente, os grandes
jornais tinham críticos de cinema que sabiam do que estavam falando, tinham
conhecimento, sensibilidade. Hoje… Nem sei o que dizer. Um dos articulistas do
grande jornal de São Paulo entendeu o filme como um panfleto da era Lula e
escreveu que alguns dos personagens principais “não passam de peças de
propaganda governista”…
Espantoso. A
violenta disputa política em curso no país está contaminando tudo,
absolutamente tudo. É o que acontece, de forma nítida, com o noticiário
econômico. Não há dúvida de que a situação é muito precária e vai continuar
precária por algum tempo. Mas há aspectos positivos que recebem pouca ou nenhuma
atenção.
Um exemplo: o
forte ajustamento das contas externas em 2015. Durante muitos anos, o Brasil
acumulou grave problema de sobrevalorização da moeda nacional. A moeda forte
prejudicou muito a indústria do país e foi gerando um desequilíbrio crescente e
perigoso nas contas externas do país.
Agora, a
depreciação do real, combinada com a retração da demanda interna, está
produzindo uma correção rápida do desequilíbrio externo, diminuindo nossa
vulnerabilidade. E a depreciação cambial vai ajudar a tirar a economia da
recessão, estimulando exportações e setores que competem com importações.
É verdade que
parte dessa melhora das contas se deve à recessão, sendo portanto “cíclica” e
não “estrutural”. É verdade, também, que a depreciação foi muito intensa num
período curto, gerando problemas para os que têm dívida em moeda estrangeira.
Mas o Banco Central tem reservas internacionais muito elevadas e outros
instrumentos para deter com sucesso movimentos exagerados — sobretudo se tiver
a ajuda de uma estabilização da situação política e de progressos em matéria de
ajustamento das contas públicas.
Sobre as
contas públicas, aliás, o que se afirma e escreve envolve frequentemente
exageros monumentais. “Caos”, “descalabro”, “tragédia fiscal” são algumas das
expressões repetidas incessantemente em artigos, reportagens e entrevistas. O
Brasil tem, sim, um problema fiscal, agravado pela crise política. Mas há quem
compare o Brasil à Grécia! Quem o faz não tem a mais remota ideia do que foi a
calamitosa irresponsabilidade dos governos gregos no período que antecedeu à
crise internacional de 2008.
Paulo Nogueira
Batista Jr. é economista e vice-presidente do Novo Banco de Desenvolvimento,
mas expressa seus pontos de vista em caráter pessoal.
Nenhum comentário:
Postar um comentário