Carina Vitral*[foto], na Folha de S. Paulo
O dia 1º de abril de 1964 ficou marcado
pelo início da ditadura militar que mergulhou o Brasil no obscurantismo por
duas décadas. O símbolo desse momento foi o incêndio da sede da UNE na praia do
Flamengo, no Rio.
Apenas agora, 52 anos depois, a UNE está
prestes a reinaugurar sua sede e espera, junto com ela, manter viva a memória
da mocidade que entregou a vida à causa democrática em nosso país. Ninguém foi
mais perseguido e torturado pela ditadura do que a mocidade que se levantou
contra o golpe.
Os tempos são outros, é bem verdade. O
Brasil é outro. A UNE também é outra. Nossa "mocidade" agora é mais
jovem do que nunca. Mas, ainda hoje, temos a democracia em nosso DNA. Não
existe
causa mais importante para UNE do que a democracia. É ela que nos une.
É ela também que nos conecta com a
mocidade de 64, que lamentava o destino do país, mas buscou coragem e força na
esperança de um futuro democrático para enfrentar os dias de tormenta
autoritária.
O pesadelo de um Estado de exceção não
veio, como muitos querem fazer parecer, pelos coturnos dos militares, pelo
menos em um primeiro momento.
O pesadelo foi gestado nos corredores
do Congresso, em reuniões de bilionários, em capas de jornais, em protestos
pacíficos contra a "corrupção e a ameaça comunista" e na construção
de um clima político de ódio, favorável a um golpe de Estado.
A UNE é uma das poucas entidades que
sobreviveram a todo esse período, mesmo que na clandestinidade, por se
posicionar decisivamente contra o golpe. E por isso mesmo tem a obrigação histórica
de se posicionar novamente em relação aos acontecimentos atuais.
Os estudantes foram parte fundamental
na luta pelo impeachment do ex-presidente Fernando Collor. Sabemos bem que
impeachment é um mecanismo constitucional que impede um presidente de continuar
seu governo depois de cometer crime de responsabilidade, exatamente como ficou
comprovado com Collor depois de uma longa CPI e um processo que lhe garantiu o
mais amplo direito de defesa.
Temos a convicção de que seremos
julgados um dia sobre nossa posição no conturbado ano de 2016, quando a
juventude do futuro avaliar os dias de hoje sem as paixões e as simplificações
que contaminam o ambiente político.
É nesse contexto que a UNE, a despeito
das críticas faça ao governo da presidente Dilma Rousseff, em especial aos
cortes na educação, defende a manutenção do Estado de Direito. Defende que o
impeachment de uma presidente eleita sem a caracterização de crime de
responsabilidade é casuísmo puro. É falta de compromisso com as regras
democráticas. E, sem respeito às regras, estamos todos namorando o perigoso
caminho do "vale-tudo".
As universidades coloridas de esperança
e diversidade, com todos os tons do povo brasileiro, são a prova de que uma
possível derrota, mesmo que amarga, continuará tendo feito toda a luta valer a
pena. Das ruas tomadas por homens que lutam e sonham nascerá o novo. A
resistência democrática deve ser a chave para o para o futuro, não para o
passado.
CARINA VITRAL, 27, é estudante de economia da PUC- Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo e presidente da UNE - União Nacional dos
Estudantes
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